ENTENDENDO O TRANSTORNO DE PÂNICO: UMA PERSPECTIVA INTEGRADA ENTRE A TCC E A NEUROCIÊNCIA

O transtorno de pânico é uma condição de saúde mental que acomete milhões de pessoas em todo o mundo. Caracterizado por ataques de ansiedade intensos e repentinos, esse transtorno pode causar sintomas físicos e emocionais debilitantes. Neste texto, exploraremos o transtorno de pânico a partir de duas abordagens complementares: a Terapia Cognitivo-Comportamental (TCC) e os avanços da neurociência. O objetivo é oferecer uma explicação acessível, baseada em evidências científicas, para ajudar na compreensão e manejo deste quadro.

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Entendendo o Transtorno de Pânico

O transtorno de pânico é uma condição de saúde mental marcada por episódios súbitos de intensa ansiedade – os ataques de pânico – que se manifestam com sintomas físicos (como taquicardia, sudorese, tontura, tremores e falta de ar), pensamentos catastróficos, sensação de despersonalização e até sensação de morte iminente. Esses episódios podem ocorrer sem um gatilho aparente, em momentos onde a pessoa não se encontra em uma situação estressante, levando o indivíduo a desenvolver um medo constante de novos ataques e, muitas vezes, a evitar situações ou lugares onde já ocorreram crises, comprometendo significativamente sua qualidade de vida.

Perspectivas da Neurociência

O transtorno do pânico tem bases neurológicas complexas, envolvendo diversas áreas cerebrais e neurotransmissores. A "rede do medo", centrada na amígdala, desempenha um papel crucial, juntamente com o hipocampo, tálamo, hipotálamo, região cinzenta periaquedutal e locus ceruleus.

Além disso, estudos de neuroimagem têm mostrado que alterações na atividade de neurotransmissores como a serotonina, noradrenalina, GABA e glutamato também estão associadas à patofisiologia do pânico:

  • Serotonina e Noradrenalina: O desequilíbrio químico nesses neurotransmissores está ligado ao Transtorno de Pânico. A serotonina influencia o humor, enquanto a noradrenalina está ligada à excitação física e à resposta de "luta ou fuga".

  • GABA e Glutamato: Desequilíbrios nos níveis de GABA (neurotransmissor inibitório) e glutamato (neurotransmissor excitatório) também podem contribuir para o desenvolvimento de transtornos de ansiedade, incluindo o TP.

    Essas alterações reforçam a ideia de que o transtorno possui uma base biológica significativa – aspecto que, aliado à abordagem psicoterapêutica, contribui para uma intervenção mais integrada.

Fundamentos e Estratégias da TCC

A TCC é uma abordagem estruturada e de curto prazo que atua na identificação e reestruturação dos pensamentos disfuncionais que alimentam a ansiedade. No contexto do transtorno de pânico, essa terapia pode auxiliar o paciente a:

  • Identificar pensamentos catastróficos: Durante um ataque, interpretações equivocadas (por exemplo, “isso é um infarto”) podem intensificar a crise. A TCC ensina a questionar e reavaliar esses pensamentos.

  • Utilizar técnicas de enfrentamento: Exercícios de respiração profunda, relaxamento muscular e registros de pensamentos ajudam o paciente a retomar o controle durante os ataques.

  • Exposição gradual: Por meio da exposição controlada a situações temidas, o indivíduo aprende que as sensações físicas associadas ao pânico não representam perigo real, o que gradualmente reduz a evitação e a ansiedade antecipatória.

  • Reestruturação cognitiva: Essa técnica visa substituir crenças negativas por interpretações mais racionais e adaptativas, promovendo mudanças duradouras no comportamento.

Estudos demonstram que a TCC, seja realizada de forma individual ou em grupo, pode reduzir significativamente a frequência e a intensidade dos ataques de pânico, mantendo os ganhos terapêuticos ao longo do tempo.

Integração com Outras Técnicas e Modalidades

Além das técnicas já mencionadas, abordagens complementares – como o treinamento em Mindfulness para aumentar a consciência do momento presente e técnicas de autocompaixão – têm sido incorporadas à TCC, potencializando seus efeitos no controle dos sintomas. O uso de diários de progresso e registros de pensamento, por exemplo, permite que o paciente se torne mais autônomo no monitoramento e na intervenção sobre seus próprios padrões de ansiedade.

A Importância do Acompanhamento Psiquiátrico

Embora a TCC seja bastante eficaz na redução dos sintomas e na prevenção de recaídas, muitos pacientes com transtorno de pânico podem necessitar de uma abordagem combinada. Em diversas situações, a medicação é essencial para estabilizar os sintomas no início do tratamento, principalmente quando os ataques são frequentes e intensos. Antidepressivos – como os inibidores seletivos da recaptação de serotonina (ISRS) – e benzodiazepínicos são frequentemente utilizados para diminuir a hiperatividade do sistema nervoso e facilitar o engajamento do paciente nas sessões de TCC.

Por isso, muitas vezes é necessário que o paciente seja acompanhado também por um médico psiquiatra, que poderá avaliar a necessidade de medicação, ajustar dosagens e monitorar possíveis efeitos adversos. Essa abordagem combinada, entre psiquiatra e psicólogo, quando bem orientada, aumenta a eficácia do tratamento e possibilita que, com o tempo, a dose dos medicamentos possa ser reduzida gradualmente, à medida que o paciente desenvolve habilidades de enfrentamento e controle por meio da TCC (Nardi et al., 2001)

Conclusão

O tratamento do transtorno de pânico beneficia-se de uma abordagem integrativa, que une os avanços da neurociência com a eficácia comprovada da Terapia Cognitivo-Comportamental. Enquanto a neurociência tem revelado circuitos cerebrais específicos e alterados que fundamentam os sintomas de pânico, a TCC oferece estratégias práticas para modificar os pensamentos disfuncionais e promover uma melhor regulação emocional. Ademais, o acompanhamento psiquiátrico pode se fazer necessário para uma intervenção mais efetiva, pois a medicação pode ser crucial no início do tratamento para estabilizar o quadro clínico.

Essa combinação de estratégias – intervenção farmacológica e psicoterapêutica – permite uma melhora significativa na qualidade de vida do paciente, contribuindo para a prevenção de recaídas e o desenvolvimento de autonomia no manejo da ansiedade.

Referências Bibliográficas

  • American Psychiatric Association. (2013). Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders (5ª ed.). Washington, DC: Author.

  • Barlow, D. H. (2002). Anxiety and Its Disorders: The Nature and Treatment of Anxiety and Panic. New York: Guilford Press.

  • Clark, D. M. (1986). A cognitive approach to panic. Behaviour Research and Therapy, 24(4), 461–470.

  • Beck, A. T. (2011). Cognitive Behavior Therapy: Basics and Beyond. New York: Guilford Press.

  • Ressler, K. J., & Mayberg, H. S. (2007). Targeting abnormal neural circuits in mood and anxiety disorders: from the laboratory to the clinic. Nature Neuroscience, 10(9), 1116–1124.

  • Han, S., et al. (2024). Cientistas da Salk descobrem via cerebral responsável pelos sintomas do transtorno de pânico. Nature Neuroscience.

  • Nardi, A. E., et al. (2001). Carbon dioxide-induced panic attacks: clinical-phenomenologic study. Revista Brasileira de Psiquiatria.